As mulheres são mais resistentes que os homens?

(Ou… por que elas desistiram menos na Maratona de Boston?)

A Maratona de Boston levantou uma série de perguntas, fez muito corredor amador sonhar com o pódio e movimentou o mundo das corridas. Mas um fator em especial me chamou atenção (e do New York Times também): as mulheres desistiram menos. O que nos leva a questionar o motivo quando se sabe que estatisticamente as corredoras tem uma média de desistência maior que a dos atletas masculinos.

Devemos lembrar que tudo foi atípico naquele 16 de abril de 2018. Choveu do começo ao fim dos 42km, teve vento e a temperatura chegou a 3 graus (a edição mais fria em 30 anos). A combinação roupa encharcada e ossos congelantes tirou da disputa profissionais de renome e com experiência. Já entre os amadores, que são guerreiros do dia a dia, muitos passaram pelo pórtico de chegada, a maioria aos trancos e barrancos, e não foram poucos os relatos sofridos na internet.

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Yuki Kawauchi, ganhador da Maratona de Boston

A porcentagem de inscritos que não concluíram cresceu drasticamente, entre os homens o aumento foi de quase 80% em relação a dos outros anos, o que equivale a 5% do total masculino. Já entre elas foi de apenas 12%, o equivalente a 3,8%.  Mas, por que isso aconteceu?

Para começar devemos lembrar que fisicamente eles levam vantagem como explica Ana Paula Becker – nutricionista esportiva com 15 anos de experiência e que atende atletas de alta performance como pilotos de stock car, ultramaratonistas e triatletas: “Os homens, teoricamente, possuem um desempenho aeróbio superior do que o da mulher, devido ao maior número de glóbulos vermelhos no sangue, o que proporciona uma maior capacidade de transporte de oxigênio. O bombeamento também é superior neles, atingindo débitos cardíacos máximos maiores. Estas diferenças os proporcionam uma vantagem fisiológica em qualquer solicitação de esportes de resistência”.

Ela ainda lembra que o fator hormonal pesa: “A testosterona ou hormônio masculino é um esteroide anabolizante natural, e proporciona a eles um desenvolvimento muscular sempre superior. Este efeito, assegura uma vantagem de força, potência e velocidade, que se projeta em qualquer modalidade esportiva que dependa destas variáveis”. Aqui ainda vale ressaltar que o ciclo menstrual e suas variações hormonais também pode influenciar a performance esportiva delas. E isso não temos como controlar. Falamos disso no post Ciclo Menstrual X Exercícios.

Em Boston a coisa mudou de figura devido as condições adversas que favoreceram as inscritas e isso tem uma explicação biológica. “Devido ao clima frio, as atletas se adaptaram mais naturalmente a essas intempéries, por seus corpos possuírem um percentual maior de gordura. Ele gira em torno de 3% para homens e 12% para elas. E ainda tem a camada de gordura subcutânea, que é duas vezes mais espessa nas mulheres.”

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Sarah Sellers, segunda colocada entre as mulheres

O nutricionista Orion Araújo lembra outras coisas que podem pesar também: “Sim, um percentual de gordura adequado ao peso da pessoa pode ajudar a suportar melhor condições adversas.  No entanto, existem outros fatores que contribuem para isso, como a questão psicológica, o tipo de alimentação e suplementação”.

Sem dúvida o psicológico contou muito, afinal o “sexo frágil” não está preparado para a desistência (nenhum animal fêmea pode desistir de um parto por mais dolorido que ele seja) e isso pode ter influenciado. No artigo do New York Times sobre o tema Alex Hutchinson – autor do livro “Endurece” –  lembra que o cérebro feminino se reajusta mais rapidamente aos objetivos diante de uma dificuldade. Outro item levantado por ele é que mulheres tendem a buscar mais a ajuda uma das outras e isso pode ter contribuído ao longo da prova.

Em suma, elas tem mais fatores contra que os homens em relação a prática de uma atividade física, principalmente corrida que exige maior condicionamento cardiovascular e potência. No entanto, a persistência pode fazê-las ir mais longe (não mais rápido, infelizmente) e isso numa prova de resistência pode contar mais que força física.

Uma coisa é certa, as atletas – mesmo as amadoras – tem mudado muitos paradigmas do esporte. Lembrando que a suas participações são recentes, a primeira mulher a correr uma maratona foi justamente em Boston em 1967. Ainda não se sabe completamente do que elas são capazes e nem até onde vão. Só podemos aguardar e observar.

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